BASTIDORES DO CUIDADO
(Genaura Tormin)
Acabo de ler o livro BASTIDORES DO CUIDADO, um diário da arte de cuidar, escrito por Nébia Maria Almeida de Figueiredo, quando no deslanchar da existência as mãos da fatalidade ofereceu-lhe um acidente de percurso triste numa pessoa querida que lhe privava os compartimentos do coração em afeto e carinho. Parceiros de ideais científicos – ambos docentes da área de enfermagem.
Tocou-me muito a emoção a compungente história desse rapaz bonito, inteligente, empreendedor que, nos píncaros da glória, no auge de sua mais bela idade, viu dificultados tantos sonhos, tantos projetos. A animalidade da violência humana o escolheu por vítima num final de tarde sombrio, quando o sol se recolhia ao horizonte.
Os seus passos foram banidos, recolhidos inertes ao canto da alma naquela tarde, para nunca mais voltar.
Uma caminhada íngreme descortinou-se à sua frente. O céu vestiu-se de negro e a dor plangente engoliu o gosto do viver. Gigantesco esforço no enfrentamento de muitas peripécias, nunca imaginadas para si, era preciso. Muitas lágrimas lavaram as suas faces. Por momentos, a gritante impossibilidade de continuar o caminho.
O anjo guardião, autor desses relatos, chegava de mansinho e insuflava coragem, estampada em pequenos mimos, afeto, cuidados e docinhos. Meu Deus, quanto carinho pode brotar de um ser predestinado, benfazejo e amigo! É, realmente, “A MÃO QUE ALISA O CORPO”, título de um dos trabalhos que ambos estavam fazendo naquela época.
Uma história tocante, numa escrita diferenciada, minuciosa no trato do corpo e da alma, onde se observa um servir com conhecimento, amor e brandura.
Em forma de um diário de bordo, a autora coleta todos os dias as impressões físicas e espirituais desse cuidar, aportando sempre no afeto gostoso de sua alma linda e dessa partilha, que reputo transcendente e antiga, embora envolta em disfarces que não se olvidam no tempo. Um encontro postergado, um coração machucado.
Em forma de um diário de bordo, a autora coleta todos os dias as impressões físicas e espirituais desse cuidar, aportando sempre no afeto gostoso de sua alma linda e dessa partilha, que reputo transcendente e antiga, embora envolta em disfarces que não se olvidam no tempo. Um encontro postergado, um coração machucado.
Numa bela roupagem, o livro se assemelha a um caderno, com manuscritos datados, pequenos poemas para extravasar os sentimentos e alegrar o paciente, além de desenhos significativos que elucidam tanta dor. Um caminho a ser aberto, uma vida a ser moldada nas contingências do destino.
Ser ou não ser. Seguir ou ficar eis a questão nessa encruzilhada de tantos aprendizados, novos saberes, tantas dificuldades. Um buril esculpindo a obra.
Por vezes, a cuidadora, com a alma esfacelada, o coração dolorido diante de impotência tão grande, sem encontrar o remédio curador para tanto desmantelo, parece sucumbir. Sua alma sofre. A oração é o seu guia. Grande ser humano num espírito protetor e despojado, que sabe se doar numa linda transcendência de amor.
Um anjo guardião que o paciente teve a sorte de encontrar nessa fase tão difícil, tão dolorida de sua vida.
Por muitos momentos a sensibilidade aflorou-me as lágrimas e eu chorei. No entanto, sei que tudo são eficientes aprendizados que nos tornam seres melhores no campeonato de nós mesmos. O remédio é sempre amargo quando se faz necessário.
E tudo acontece tão inesperado! O certo é que somos devedores por aqui. Não sabemos o porquê, mas tudo tem a sua razão de ser. Chega na hora exata, no momento certo, convergindo para o nosso bem. É como se estivesse escrito nas estrelas.
E o diário de bordo teve o seu fim, com o desembarque numa cidade do interior, onde o nosso personagem viveria no aconchego dos seus familiares, tentando emendar retalhos, reconquistar as emoções e encontrar outra maneira de marcar passadas pelas estradas da vida.
E foi o que aconteceu. Embora, os dissabores, os sofrimentos desse novo redimensionar da existência, tudo voltou ao seu lugar, reflorescendo vidas, cuja colheita se faz farta e encantadora, abrindo muitas portas, no exercício do amor.
Nova maneira de viver estampou-se garbosa no tilintar sonoro de quatro rodas benfazejas. E o nosso rapaz cresceu tanto que atingiu os píncaros. Sua experiência jorra como a chuva, adubando, alentando e defendendo vidas.
O anjo poeta ainda tece devaneios nos veios da poesia. As asas ainda se cruzam, protetoras e risonhas.
Excelente leitura.