MENSAGEM A MEU PAI
Papai,
hoje é o seu dia! Como sinto a sua falta!
Fecho
os olhos e o vejo ao lado falando das coisas da vida.
A
tarde sombria, nostálgica, invade a janela, sussurrando-me
lembranças, muitas saudades, abandono... As nesgas do sol poente,
esgueiradas entre os espigões de concreto, parecem trazer-me, por
acalanto, os seus recados, a sua presença junto a mim.
Sinto
uma enorme falta de você, meu pai! Falta do seu ombro amigo, do seu
semblante autoritário de quem tudo sabia, de quem tudo resolvia. A
última palavra, o porto seguro. O nascedouro de forças, energias,
caminhos e direções.
Que
saudade do nosso convívio, dos meus filhos pequenos, da alegria da
sua chegada, das memórias contadas, da pessoa maravilhosa que você
sempre soube ser.
Lembro-me
dos consertos que fazia. Havia sempre uma solução, uma saída. Como
era inteligente, criativo... Quando partia, tudo ficava novo: os
brinquedos, as tampas das panelas, as portas emperradas... Tudo
voltava a funcionar. Vida nova. Até o King, o nosso cachorro, sentia
a sua falta. Quantas brincadeiras, quantas risadas nós dávamos
juntos! E a vida era bela, bela vida!
Lembro-me
de você, papai, ao meu lado no leito de hospital, quando a vida
achou por bem me tolher os passos. Sofregamente, você me afagava os
cabelos, passando-me a mão sobre a fronte. Austero e forte, você
fora sempre. Naquele dia, mostrava-se acabrunhado e humilde ao meu
lado. O tempo marcava-lhe o rosto. Os poucos cabelos já encanecidos
deixavam à mostra a cabeça lisa pela calvície, simbolizando as
renhidas batalhas enfrentadas, e diante de mais uma a enfrentar.
Como
sofrera para cumprir bem a missão! Para você, eu era o modelo
ideal. Havia estudado, casado como mandava o figurino. Havia-lhe dado
netos e tudo o que sempre admirou no campo das prendas domésticas,
além de haver concluído um curso superior. Afinal me proporcionara
uma educação num colégio de freiras.
Ali,
ao meu lado, num testemunho de cumplicidade e sofrimento, procurava
esconder-me os olhos úmidos enquanto eu tentava sorrir para
aliviar-lhe a dor.
Como
gostaria de ter-lhe evitado tamanho sofrimento!
Entendo
o que se passava com você: os filhos são mais do que partes de nós
mesmos. Depois, uma nuvem de tristeza cobriu o nosso lar, a nossa
vida, a sua vida, papai! Passei a vê-lo cabisbaixo de barba grande,
logo você que era tão vaidoso. Eu sabia que você sofria.
É,
papai, quanta tristeza eu lhe dei! Hoje, volto ao passado e vejo que,
mesmo sem andar, eu caminhei muito! Tenho os pés cansados da
jornada, feridos pelas pedras do caminho. Preciso de um colo para
descansar, preciso de um ombro para chorar.
Mas
eu tentei caminhar... Tento, ainda, com “unhas e dentes”. Insisto
sempre. Recomeço a cada tombo, a cada caminho truncado. Se não
marco passadas no chão, marco-as no coração, em trabalho, amor,
poesia... Queria que você estivesse aqui para ver os meus rastros
deixados na estrada da vida.
Com
certeza, você foi um grande motivo para o meu desafio. Eu queria
entregar-lhe o troféu do meu esforço, mas você foi embora, numa
noite fria, sem dizer adeus. Nem sequer nos permitiu ajudá-lo na
hora derradeira.
Mesmo
estando do outro lado da vida, ficarei feliz se ainda continuar a se
orgulhar de mim. Se no seu coração eu ainda for aquela garota
certinha que você achava que eu era.
Papai,
que saudade! Mas que saudade, mesmo! Receba o preito de minha
gratidão, do meu afeto, do meu carinho...
Sua
filha,
Genaura
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